Ingressamos no crossfit exclusivamente por uma vaidade, vaidade com o próprio corpo, melhor aparência, perder umas gordurinhas, talvez ganhar massa magra. De modo geral, esse é o primeiro contato que o homem médio tem quando busca o crossfit.
Com o tempo, necessariamente, o objetivo anterior da busca do “shape” acaba ficando em segundo plano no esporte. É nesse momento que o praticante do crossfit sabe o que realmente interessa, é performance, indiscutivelmente.
No Brasil, fazemos o Murph no período de dezembro, diferente do resto do mundo que faz no memorial day, que é ali por março. Para o praticante de crossfit, esses benchmarks servem de parâmetro de performance, logo, é genial o fato de repetirmos esses treinos anualmente, justamente para poder medir a nossa evolução.
Esse ano (2022), uma semana antes do Murph, decidi fazer de colete. Lembram da vaidade que falei no início do texto? Ela ataca novamente! Pensei: “capacidade pra fazer de colete acho que até tenho, mas definitivamente as fotos ficariam ótimas, no maior estilo navy seal, óculos escuros, colete tático e a cara de “brabão””.
Quando tomei a fatídica decisão de realizar o workout de colete, me surge uma doença, no grupo de atletas do Máquina de Vencer, e uma pessoa solta o seguinte: “Façam o Murph, mas o façam com cuidado, um amigo foi para o hospital com princípio de rabdomiólise”.
Li e pensei: “Que c** é rabdomiólise? Tomei a anti rábica recentemente, deve tá de boa”. Porém o buraco é mais baixo do que imaginava, esse flagelo de difícil pronúncia ocorre quando há uma alta ingestão de bebidas alcoólicas ou com excesso de atividades físicas, rompendo assim as fibras musculares e sobrecarregando os rins.
Quando pesquisei no Google sobre a doença, não vou mentir, deu um medinho, mas a vaidade pelas fotos falou mais alto e mandou o medo da rabdomiólise para longe.
Chegou o dia do Murph, dia 10 de dezembro de 2022, um dia de alegria, o box lotado, a galera pronta para superar os limites, cheguei já com a seguinte estratégia: 20 minutos para primeira milha e os 100 pull ups, 20 minutos para os push ups e os 20 minutos finais para os 300 agachamentos e a milha final. A minha meta era 1h.
No mundo das ideias o plano era infalível, pensei que a maior dificuldade seria nos push ups com a carga extra, 20 minutos daria tranquilamente. Ledo engano, fazia um bom tempo que não treinava de colete, fiz o aquecimento com ele, não foi tão confortável quanto havia imaginado. Teimoso, segui em frente.
10h30 da manhã de sábado saiu a primeira bateria, e eu estava nela, ia fazer o Murph da forma prescrita e com o colete e na corrida inicial já vi que não seria fácil. Nos primeiros 200m já senti o coração mais acelerado do que o comum para uma corrida simples. Era o maldito colete pesando, fingi normalidade e segui em frente. O sol “torava” em Curitiba nesse dia, as pessoas caminhavam felizes nas ruas com os seus cachorros e nós ali, encarando a primeira milha do murph em uma leve subida.
Cheguei da primeira corrida com 10 minutos, em tese, haviam mais 10 minutos para fechar o primeiro bloco de 20 minutos. O plano continuava infalível. Então entrei para os pull ups fazendo butterfly, de 6 em 6. A contagem ficou difícil, reduzi e me abracei aos números redondos. Iniciei com 3 séries de 6 e uma de 2. A dificuldade não era somente a da soma, era da sobrecarga do colete. Continuei de 5 em 5 até fechar 90 pull ups. A esse passo não havia mais qualidade de movimento, o queixo passando a barra era rep válida. Bíceps, tríceps e dorsais duros. Terminei os pull ups de um em um. Foi o que deu.
Terminei o primeiro bloco um minuto atrasado, com 21 minutos no cap. Segui em frente. O plano continuava e ali entrava a longa jornada dos 200 push ups. No ano de 2021, fiz o Murph sem colete e sofri horrores nos push ups com quebras burras. Em 2022, entrei confiante, com quebras extremamente estratégicas, de 3 e 2, deu certo. Consegui fechar os push ups com essa estratégia.
Ao passo dos 180 push up intermináveis, meu colega Jalmir, que estava de colete também, esmoreceu, extremamente pálido. Ele queria chorar, cogitou fazer com os joelhos no chão e tirar o colete. Neste momento era o Diabo agindo, logo já afastei esses pensamentos da cabeça dele e disse: “Tu não vai tirar esse c**** agora, faltam 20 para terminar, e os 300 agachamentos vão ser tranquilos”. Jalmir nesse momento ficou se recuperando e segui com os meus push ups. Sucesso pelo terminado, fracasso por ter ido além do tempo que havia determinado. 54’ no relógio.
Se existe um plano A, subentende-se que existe um B. E então, nesse momento, o plano B veio à tona: simplesmente terminar o Murph.
Entrei nos agachamentos. Era a minha praia, cheguei glorioso, e de cara, com meu colega Marcelo. Já mandei 50 unbroken. Que erro! Paguei caro por ele. Ao passo dos 100 agachamentos, definimos 10 séries e 20. Fizemos 5. Faltando 100, 10 séries de 10, a lombar cobrou o preço. Concluímos os agachamentos em coisa de 10 minutos, 64’ no cap. Plano A falhou, plano B continuava de pé.
Quando saímos para correr, o headcoach e atleta do Máquina de Vencer, Felipe Formentão, que fechou o Murph de colete em 56’, nos disse: “Vai “caminhandinho” agora para soltar as coxas e depois pega ritmo e vai.”. Fizemos isso, porém, caminhamos um pouco mais do que o desejado. A expansão da caixa torácica era um problema nessa altura, e o colete mais atrapalhava. Pensamentos de abandonar o colete no meio da rua tumultuaram minha mente. Segui em frente durante a subida, trote leve e eventualmente caminhava. Quando chegamos aos 800m era hora de voltar, era descida, e como fala o ditado popular:“para baixo todo santo ajuda”.
Definitivamente, na corrida final, a descida foi libertadora, vento a favor, cabelos ao vento. Se fosse um filme de Hollywood, aquele seria meu momento. Perto do final, já não aguentava mais. Marcelo gritou me incentivando. Viramos a esquina e entramos no box. O plano B deu certo, e o cap foi de 74’. Como um bêbado de porre que jura nunca mais beber, prometi que nunca mais faria o Murph de colete.
Quando entramos, literalmente, tirei o peso dos ombros: joguei o colete no chão. Me senti como Piccolo quando retirou as pesadas ombreiras na luta contra Goku no Dragon Ball, assim que a vest atingiu o chão o pó subiu. Enquanto eu caía no chão que me abraçava, aquele foi meu momento, meu prime time. E isso ninguém vai me tirar. Sei que é clichê falar isso, mas cabe: a dor é passageira mas e a glória é eterna.
Domingo à noite chegaram as fotos do Murph, e com elas aquele medo e o pensamento: “Será que aquele sofrimento todo valeu a pena para as fotos terem ficado uma m***?” Ao ver as fotos, tive a resposta: SIM! Valeu muito a pena. Modéstia à parte, o modelo aqui ajuda muito.
Sobre o Murph 2023, agora com a vaidade de lado, e com a cabeça no eixo correto pensando na performance, vou fazer de colete sim. Quero pôr o plano A em prática novamente. E se não der certo, sempre temos o B, e quem sabe o C.
Para quem tem medo ou receio de fazer o Murph, fica meu conselho: fazer completo não é para qualquer um, mas é algo que recomendo a todos.
E VOCÊS? JÁ FIZERAM O MURPH?
Sim
Não